Fernando Dias Cyrino
Apesar dos grandes investimentos feitos os programas de qualidade não alcançaram os resultados esperados. Importados faltam-lhes ainda a inculturação para que adquiram espírito e emoção, tão necessários para que se incorporem naturalmente ao nosso modo de proceder.
Houve um tempo no qual os produtos oriundos dos países orientais eram, de antemão, considerados como de qualidade duvidosa. Para sair dessa situação, inspirados pelo americano Edward Deming, os japoneses e em seguida seus irmãos asiáticos desenvolveram programas de qualidade total. A partir daí conseguiram, pouco a pouco, alterar a percepção que o mundo tinha dos seus produtos.
Feita essa conquista, passaram um grande susto no Ocidente. Vimos chegar aos portos produtos mais baratos, mais adequados e melhor ainda, dentro de padrões de qualidade iguais ou mesmo superiores aos produzidos nas indústrias ocidentais. Sem dúvida que na raiz da crise econômica mundial nascida na América há mais coisas, além dos empréstimos duvidosos concedidos ao mercado imobiliário. Dentre suas causas remotas reside também a dificuldade que a indústria teve (e em vários setores, como o automobilístico, vive ainda), de se recuperar do competitivo ataque oriental aos seus negócios.
O mundo já tinha mudado. O Japão fazia e acontecia nos Estados Unidos e na Europa e vivíamos ainda acomodados nos tempos do “controle de qualidade”. Feito a reboque do processo produtivo, resultava em bastante retrabalho, desperdício e até na perda de lotes inteiros de produto final. A década de oitenta, enfim, assistiu o Brasil acordar para a qualidade total. As empresas, começando pelas exportadoras, concluíram que ou se modernizavam o que significava dentre outras coisas, cuidar da qualidade dos seus produtos e serviços em toda cadeia produtiva, ou se tornariam em curto prazo cases de fracasso empresarial.
Não se concebe na atualidade uma organização de sucesso que prescinda de um programa de qualidade e sabemos que não é o bastante tê-los. É necessário hoje em dia ir mais além. É preciso que os processos, serviços e produtos sejam auditados e certificados externamente.
Apesar de todo esse esforço e investimento, é notório que os programas de qualidade não atingiram o resultado que se esperava deles. Os processos mantêm seus problemas e nós burocráticos. Alem do que o índice de falhas, retrabalho e produtos e serviços sem a qualidade requerida, em muitas empresas costumam ser ainda altos.
A questão foi que importamos o modelo e ferramentas, sem levar em conta que somos bem diferentes dos povos que os criaram e com eles alcançam tanto sucesso. Importou-se o “hardware” sem que tenha havido o cuidado devido com a adaptação do ”software” à nossa cultura. Por isto o seu funcionamento eficaz somente se dá quando há ações bem diretas firmadas em sua direção. Diminuída a pressão perdem-se os avanços e ocorre o retorno ao ponto anterior.
Diagnostica-se uma falta de espírito e emoção nos programas de qualidade total. Por conta disso eles não são assumidos naturalmente, não sendo incorporados no “DNA” dos empregados. O fato é que não basta ter o foco da atenção somente no modelo e em suas ferramentas, ou seja, na qualidade da linha de produtos e serviços.
É necessário cuidar também da qualidade total das pessoas envolvidas no processo produtivo. Para se ter programas de qualidade e produtividade de real excelência, há a necessidade de se investir nas pessoas que os conduzem. Não chega ter pessoas bem treinadas e competentes tecnicamente para fazer a qualidade. Mais do que isto, é necessário que elas estejam bem.
Obter resultados excelentes e sustentados no longo prazo, quando os empregados não se sentem realmente integrados, possuem baixa confiança na instituição e têm pouca participação nas decisões é uma missão impossível. É preciso investir na “qualidade total” das pessoas que a constroem. E fazer isto não implica necessariamente tratar das políticas de salários e benefícios. Mais do que isso é necessário desenvolver programas voltados para a educação, participação e crescimento dos empregados.
Assim, mais do que cumpridores de ordens e de horários, teremos gente comprometida além do seu trabalho. Profissionais integrados, com espírito, competências atualizadas e tendo clareza do sentido do que estão vivendo. Gente assim, com “qualidade total”, será capaz de assimilar a qualidade total como parte integrante da atividade e da sua realização como profissional e ser humano.