Fernando Cyrino
Seus valores não condizem com os valores da organização onde você trabalha? Entenda o que são valores e veja como proceder neste caso.
Ao assinar um contrato de trabalho com uma organização estaremos também assumindo os seus valores. No decorrer do tempo, com a convivência do dia a dia do trabalho, caso venhamos a sentir que aqueles valores da instituição da qual fazemos parte não são os nossos, pelo menos em sua maioria, será vivida uma crise, a qual costumamos dar o nome de “Crise de Valores”. Esta coincidência dos nossos valores com os da organização da qual fazemos parte precisa ser, para que nos sintamos confortáveis, de pelo menos de uns 60%. Quando não são coincidentes os valores e passamos a viver esta crise, poderemos assumir três caminhos:
- O primeiro é o mais simples. Trata-se de largar tudo, arrumar as gavetas e ir embora para casa. Isto se dá quando, ponderando-se na bacia dos prós e dos contras, chegamos à conclusão que não vale a pena continuar, porque ficar significará que estaremos nos ferindo interiormente ou, dizendo de outra forma, quebrando nossa integridade.
- O segundo caminho possível é permanecer na organização e trabalhar para mudar aqueles valores com os quais não há concordância. Este trabalho se dá a partir, principalmente, do exemplo e da busca por aliados para a causa. Caso não se tenha alto poder de influência na organização, é muito difícil empreender este caminho e realizar esta mudança, mas é muito meritório que seja pelo menos tentada. Fazendo isto, além do bem que será feito à sociedade como um todo, estaremos realizando algo que sem sombra de dúvidas é gerador de grande realização interior. Na pior das hipóteses, mostraremos a nossa discordância com o que é praticado.
- O terceiro caminho, que a princípio dá a impressão de ser simples, na verdade tem um alto custo final e, por isto, é preciso se ter consciência dele para poder segui-lo. Consiste em assumir como meus aqueles valores organizacionais com os quais não comungo. Ao fazer isto assumo a quebra da minha integridade. Os motivos para isto são vários e cabe a cada um, junto ao seu travesseiro, avaliar se valerá a pena segui-los.
O que é um Valor? Falando de uma maneira bem óbvia, Valor (com maiúscula) é aquilo que verdadeiramente vale para mim. Algo que é tão profundo e significativo em mim que me impede de abrir mão dele. Abrir mão do valor terá o significado de perder a integridade. Todos sabemos do custo de se estar “desintegrado” moral e eticamente. De quais valores não abro mão? O que vale realmente para mim? O que ensino aos meus filhos, ou às pessoas que de uma ou outra maneira dependem de mim e, a partir do meu ensinamento, sinto-me orgulhoso quando vejo que assumiram como real Valor o que lhes passei? São questões que precisamos de vez em quando nos fazer para sabermos por onde andam e como segue a saúde dos valores que praticamos.
O Valor é algo que vale a pena e ao dizer isto estamos afirmando duas coisas muito fortes e bem significativas. Da primeira, já dissemos: o Valor é aquele ponto, aquele aspecto da vida com o qual não dá para se negociar. Algo que nos é impossível, mesmo que estejamos sozinhos ou que ninguém nos esteja vendo, abrir mão. O segundo aspecto é mais sutil e diz respeito à pena do Valor. Tudo que vale tem a sua pena, o seu custo intrínseco. Ele vale, mas tem a sua pena. E esta pena gera riscos, requer cuidados. Pode nos levar à contramão de estradas organizacionais. Ao se assumir valores pode-se sentir pressões, já que a sociedade costuma reagir, indicando-nos que deveríamos abrir mão deles.
O Valor é algo muito interno e por isto, não costuma ser percebido em si mesmo. Ele é mais observado a partir do comportamento que é gerado a partir dele. É a nossa atitude, alavancadora de um comportamento concreto frente ao mundo que mostrará às demais pessoas o que realmente vale para nós.
Há três transformações em andamento nas organizações, conforme muito bem nos demonstra Sumantra Ghoshal em seu trabalho Beyond Strategy to Purpose. Em alguns lugares elas vão mais avançadas, em outros ainda estão bem incipientes e são pouco notadas, mas atenção, porque elas já estão acontecendo à nossa volta. Estas são mudanças de paradigmas e estão indicando para as empresas um novo posicionamento em três aspectos bem concretos e importantes.Antes vista muito mais como uma entidade econômica, a organização passa a ser enxergada agora, e este movimento é preciso que venha do topo, como instituição de valor social (atendimento à sociedade). Dizendo de outra forma, poderemos falar que as organizações mudam da Estratégia para o Propósito.
Até agora percebida como uma grande estrutura (prédios e máquinas, ossos e músculos, capital e tecnologia), a organização começa a ser observada como Processo. Um conjunto de papéis e relacionamentos. Ou seja, ela vai de Estrutura para Processos.
Da mesma maneira que os recursos materiais, tecnológicos ou financeiros, dizemos até agora “recursos humanos” e isto pressupõe que as pessoas, como os demais recursos, são peças substituíveis. Na nova organização que virá a tendência é de que o grande valor seja as pessoas. Elas colocadas como o bem chave da empresa. Caminhamos de sistemas para pessoas.
No novo papel a ser assumido pelo antigo RH, a nova Gestão de Pessoas, caberá o cuidado com os valores organizacionais. Defini-los organizacionalmente e fazê-los valer a pena. Discutir com todos da organização para descobrir realmente o que vale e divulgá-los. Sem tê-los de forma transparente, como poderemos saber se estão sendo seguidos? Caso descubramos que eles não estão, é porque não os sentimos válidos para a organização da qual participamos.
Os valores são inerentes ao ser humano. Eles fazem parte da essência do capital humano (caminhamos de sistemas para pessoas) e esta essência prevê que nós (as pessoas da organização):
- Trabalhamos com as competências atualizadas, ou seja, há que se ter um plano de educação corporativa na empresa para não deixar que as pessoas fiquem desatualizadas. E este esforço não pode se dar apenas pelo lado da empresa, mas também faz parte do papel de todo o empregado.
- Temos Espírito e Emoção. Não somos apenas mão de obra. Somos muito mais, somos mãos, pés, cabeça, espírito, emoção, pensamento... Seres integrados que não podem ser vistos apenas como máquina ou força bruta.
- Empenhamo-nos por um sentido. Não dá mais para trabalhar de forma efetiva e comprometida sem que se tenha clareza do sentido maior daquilo que se está fazendo. Onde está o valor que é agregado a esta atividade? Como vê-la no processo como um todo? Qual o sentido disto? Que sentido maior tem o que realizo no dia a dia?
Para que a comunicação dos valores se dê sem que haja maiores ruídos precisamos desenvolver a competência do feedback. Por isto é necessário nos conhecermos mais para sabermos como somos percebidos pelas pessoas à nossa volta. Sempre que nos manifestamos, impactamos aquele que nos ouve ou observa e este impacto pode ser sentido de três formas diferentes: Posso estar impactando-o só fazendo valer o que acredito e não dando lugar ao espaço que ele tem direito. Serei visto então como alguém que se comunica de forma agressiva e consequentemente gerarei resistências dos outros ao meu comportamento. Posso também não estar me valorizando e só estar levando em conta o que o outro diz ou faz. Nesse caso o meu comportamento é passivo e isto causa um impacto diferente, podendo ser que eu esteja sendo visto como fraco, mole, descompromissado e omisso pelos que me cercam.
O comportamento que causa geração de real valor e um impacto positivo, fazendo com que as pessoas compreendam o significado profundo do que estamos lhes comunicando e se sintam bem (mesmo que doa o que lhes dissermos), é o assertivo. Ao sermos assertivos fazemos valer os nossos direitos e também estamos respeitando o direito daquele com quem interagimos.Trabalhar o feedback é muito importante para as lideranças e também para os participantes dos processos de mudança (afinal, no caminho da mudança todos somos lideres). Durante a caminhada para a mudança organizacional, é necessário que se aprofunde mais este e outros aspectos das relações e da comunicação. É comum que se pense que dar feedback é simplesmente ir falando com o outro do que sentimos ou pensamos, algo como passar as nossas impressões. Nada mais enganador. É muito mais do que isto, o feedback: tem uma motivação e um conteúdo, conforme nos ensina Kleber Nascimento. A motivação pode ser o respeito (amor) ou o desrespeito (desamor). E o conteúdo pode ser a verdade e a mentira.
Conteúdo / Motivação | Amor | Desamor |
Verdade | Verdade/amor | Verdade/desamor |
Mentira | Mentira/amor | Mentira/desamor |
Saber dar e receber feedback é condição chave para que possamos transformar os nossos grupos em equipes de alto desempenho, tornando-os mais capazes de liderar a mudança do RH rumo ao papel de área estratégica na gestão de pessoas.
Encerrando esta reflexão sobre Valores, fiquemos com essas seis perguntas que são necessárias sempre que nos depararmos com algo que nos dê a impressão de que não é tão bom ou tão interessante, mesmo que não fira leis e regras.
Seis Perguntas para Aumentar a Sensibilidade Moral