A pós-modernidade, em seus múltiplos sentidos, gera a sensação de dívida e cobra dos gerentes a competência do discernimento.
Dentre as várias características dos tempos atuais há uma que muito me chama a atenção. Trata-se do sentimento de dívida que a pós-modernidade costuma trazer aos líderes. Chega-se ao final do dia, ou de algum outro período marcado de tempo, com a sensação de que não se escolheu a coisa certa e nem se atendeu a tudo aquilo que havia sido projetado. Sorrateiro, chega então o sentimento de dívida em relação à agenda, às tarefas não desempenhadas total ou parcialmente e entregas que deveriam ter se dado.
Fosse só em relação às coisas ainda bem, mas a sensação de débito se dá também em relação às pessoas. Com elas pode-se bem observar que ocorrem desse jeito as sensações de dívida: um pouco com os superiores, mais acentuadamente em relação aos pares e colegas e de maneira intensa com as equipes comandadas.
A tecnologia posta à disposição, que em tese, deveria facilitar a vida dos gestores, fazendo com que se tivesse mais tempo disponível para planejar e gerenciar pessoas, não cumpre essa sua missão. Ao contrário poderá manter o líder preso à sua mesa. Ela funciona assim muito mais como um dos famosos “desperdiçadores de horas” daqueles antigos programas de treinamento gerencial de administração do tempo.
Há que se saber gerenciar mesmo em meio às ondas de e-mails que chegam a todo o momento. Saber filtrá-los e procurar responder a eles pessoalmente poderá ser uma boa saída. Mais ainda vale averiguar se muitos deles não são meros registros gerados pela insegurança, ou mesmo alguma das sutis “delegações para cima”, que se dá quando o empregado nota que o superior é daqueles que não podem ver alguém com alguma dificuldade que logo irá assumi-la.
O mundo novo, pós-moderno, é tempo privilegiado de sutilezas e paradoxos, É preciso atenção ao se caminhar nele, eis que possui múltiplos sentidos. A vida organizacional, em meio à parafernália tecnológica, quem vem para agilizar e dar eficiência à gestão requer cuidados para que não se desumanize o gerenciamento, tornando-o frio e impessoal. Um espaço no qual a conversa franca e o olho no olho vai sendo trocado pela comunicação escrita, mesmo quando o remetente está a poucos passos do destinatário da mensagem.
Nesse cenário o simples é deixado de lado e a complexidade é que acaba se tornando mais valorizada. Por isto, as decisões, além da exigência de rapidez crescente, estão a demandar mais análises e olhares mais acurados, carregando em seu bojo níveis de comprometimentos bem maiores para quem as toma.
O preto e o branco se misturam em mil nuances, À antiga contraposição de opostos inerente aos tempos passados (branco ou preto, luz ou sombra, certo ou errado...), vivenciamos agora constantes combinações mesclando as oposições. Essas misturas, gerando o aumento do nível de dificuldade no gerenciamento e tomada de decisão, carregam dentro de si o embrião do stress excessivo e pernicioso. A miscelânea de dados e fatores faz com que se deva discernir constantemente, para que o executivo mantenha a sua integridade, a pertinência do “e”.
A menos que se tomem decisões de forte mudança existencial, não dá para se fugir a esse cenário. É nele que se trabalha, o lugar onde se vive. Daí que, mais do que nunca, é necessário vislumbrar saídas. Uma delas e que considero fundamental para o sucesso do gerente, está na ajuda para o desenvolvimento da competência do discernimento. Infelizmente esta não é matéria que se costuma ver por aí nos programas gerenciais. Acredito ser este o momento adequado para que seja estudada lá.
Ao contrário do que se costuma pensar o discernimento não se dá na escolha entre uma “coisa boa e outra pior ou ruim”. Isto não é discernimento, mas mero uso da inteligência. Discernir na realidade é possuir a capacidade de se escolher, dentre os muito sentidos bons ou razoáveis de algo, aquele que leve ao melhor caminho para a organização e consequentemente para as pessoas que dela são parte.