Fernando Dias Cyrino
Apesar de superada a postura fechada e autoritária do chefe continua presente no comportamento de alguns gerentes atuais.
O “chefe” faleceu. Seu obituário é parte integrante dos bons manuais de administração nessas últimas décadas. O problema é que, apesar de morto, ele volta e meia retorna nos assombrando. O chefe é fantasma que insiste em viver no Século XX! Incorporado em comportamentos e atitudes dos gerentes modernos.
Essa postura da chefia, autocrática e descuidada com o ser humano é característica de um equivoco da gestão das pessoas.Elas não são preparadas para o serviço do gerenciamento e muitos são “promovidos” ao cargo de liderança, sem terem tido acesso às verdadeiras e boas ferramentas de gestão. Sentem-se inseguros e para esconder os medos adotam uma postura autoritária.
Há alguns momentos na organização, principalmente em meio às grandes crises, nos quais a postura antiga se torna necessária. Num incêndio não dá para se convocar uma reunião com o intuito de definir critérios de evacuação do prédio. Em situações assim já há pessoas predeterminadas que tocarão as coisas para safarem-se todos do problema. Não é disso que tratamos aqui.
Não dá para suportar é a subordinação rotineira ao estilo característico dessa figura já tão superada e cara. Quem paga a conta? Com certeza que a organização. Esse tipo de postura termina por gerar baixos resultados.
É muito fácil reconhecer esse tipo ressuscitado. O chefe pode até tentar esconder seu modo de proceder, envernizando-o através de conhecidas atitudes paternalistas. Mas um olhar mais atento logo será capaz de desmascará-lo distinguindo-o mesmo camuflado na paisagem organizacional. Para ajudar nesse reconhecimento colocamos aqui, a partir de ditados falados na hora do cafezinho e que justificam seus comportamentos, dez características dele:
1 – Manda quem pode, obedece quem tem juízo. O chefe é mestre em passar este recado. Precisa marcar seu território mostrando para todos que é ele quem manda. Ao agir assim estará inibindo a criação de lideranças e passando a clara mensagem de que não gosta de questionamentos nem de discussões. As pessoas entenderão. Apesar do chefe as achar lentas e mesmo burras, elas compreendem fácil. Só que algumas - as melhores - darão um jeito de sair e as demais se tornarão obedientes e mesmo subservientes, evitando tomar decisões com receio de o desagradarem. Tal atitude fará com que os conflitos sejam varridos para debaixo do tapete. Ali, protegidos, mais irão crescer. Quando enfim explodirem os estragos serão tremendos.
2 – Comandar é ter todas as informações. Nada mais falso. Trata-se de algo do qual o chefe costuma se valer para demonstrar segurança. No mundo atual é impossível se ter todos os dados. Mesmo que fosse viável obtê-los, o tempo e esforço gastos na sua busca farão com que, quando estiverem à mão, a oportunidade para a realização da atividade já terá passado. Por último, e mais importante é que esta postura provoca a criação das “caixas pretas”. A informação deixa de ser disponibilizada com liberdade, passando a ser guardada cuidadosamente para ser utilizada como “moeda de troca”.
3 – O chefe é aquele que tem certezas. Nada disso. O líder é aquele que, como qualquer outro ser humano, é tomado também pelas dúvidas. A equipe daquele chefe que diz ter toda certeza é sabedora de que ele está tentando inutilmente esconder seus receios. Afirmar-se somente com certezas propicia a criação de seguidores que não pensam e só obedecem. Os regimes autoritários, com seus tantos fanatismos e perenes afirmativas, são exemplos desse tipo de comportamento.
4 – Pato novo voa baixo. É a maneira delicada e pseudo paternal com que os chefes modelam os novos que chegam às suas áreas. No fundo estão dizendo: "Adeque-se para sobreviver. As coisas aqui funcionam é assim e não queremos novidades nem ousadias". Essa postura provoca continuísmo e perda de efetividade. No longo prazo o chefe achará jeito de se livrar daqueles que insistem em voar, contratando para trabalhar com ele somente quem já pensa, sente e age de maneira alinhada ao seu modelo. Deixado muito tempo na função o chefe torna-se cada dia ainda mais caro, pois que a incompetência de uma área assim tem custo alto. Pior ainda quando se torna formador de opinião e consegue passar seu comportamento para outros. Termina por criar novas formadas de chefes. Ele não gosta do diferente, é previsível e não arriscará realizando o novo.
5 – Time que está ganhando não se mexe. Esta postura do chefe termina por trazer o comodismo. Ao se achar na frente ele deixará que as oportunidades passem pela janela não sendo vistas. Afinal, estará deitado em berço esplendido curtindo vitórias passadas. Time que está ganhando é aquele que necessita ser sempre aprimorado e as mexidas são sempre bem-vindas. O chefe com essa postura mostra desconhecer que as pessoas depois de certo tempo não mais são desafiadas pelo que executam e se tornam pouco a pouco presas às suas zonas de conforto. Sem haver alguma tensão não haverá mudança nem crescimento.
6 – Aos amigos tudo... O chefe é mestre em criar e manter grupos de amigos. Ele não costuma fazer isto porque aprecie o companheirismo, ou porque se sinta bem em estar com eles. O chefe quer com este comportamento demonstrar que quem está com ele é que está bem. Não fazer parte do seu grupo carrega o significado terrível de que não se faz parte do círculo do chefe. Os amigos têm tudo o que necessitam para si com o chefe. Os demais precisam lutar muito para conseguir aquilo que é necessário não para eles, mas para a organização.
7 – Quem trabalha muito e faz bastante hora extra é bom. Este erro é muito comum nos chefes. Ele passa a idéia do comportamento do se fazer muito como positivo. Só que ele não consegue levar em conta se o que está sendo feito, mesmo que seja a coisa certa, é aquilo que é necessário. É preciso analisar o porquê do se estar tendo que fazer muito. É problema de dimensionamento de pessoal, ou de estrutura? Caso o seja é necessária a readequação. O que tenho visto é que se faz muito por não se cuidar de dois componentes essenciais para o sucesso de qualquer atividade: Planejamento e Treinamento. Chefe também adora relógio de ponto, assinaturas de presença e coisas assim. Como seu pessoal produz pouco ele precisa ter certeza de que estão no trabalho. Por trás de horas extras, ou do excesso de trabalho, quando não se dá o caso de alguma questão sazonal ou crise, pode haver a mão descuidada de algum chefe redivivo.
8 – O erro é a prova cabal da incompetência. Meu Deus, como isto é perigoso. Imaginemos quantos inventos, quantas criações maravilhosas do ser humano não foram estancadas na raiz por causa deste comportamento induzido pelos chefes. Por medo de errar, sob um regime assim, é melhor não fazer nenhuma tentativa. Tentar é correr riscos e o chefe não sabe lidar com o erro. Ele o pune inexoravelmente. Pouco a pouco passa para o grupo a mensagem tácita ou explícita de que é perigoso errar. Gera então o comportamento defensivo e receoso. No longo prazo esta atitude leva à catatonia organizacional.
9 – Você é pago para fazer. O chefe adora “mão de obra”. Ele é do tempo em que o ser humano era colocado no mesmo nível dos recursos financeiros e materiais. Por isto fica incomodado com pessoas pensantes. Pensar pode sim, mas somente dentro da atividade e segundo os moldes (chefe também se encanta com molde) do que ele definiu para a tarefa. O recado implícito passado por este comportamento, é que não se pretende que haja nenhuma mudança ou transformação por ali. Isto até o momento em que a crise bata à porta e aí poderá ser muito tarde para se tentar qualquer ação, além do que as pessoas estarão tão treinadas ao fazer, que o pensar e discernir será competência a ser ainda desenvolvida por eles.
10 – Deixa comigo. O chefe é eminentemente centralizador. Ele incapacita seu time a realizar. Somente ele sabe fazer bem. Este comportamento ruim, além de provocar um desvio de função, eis que deixará de exercer a função gerencial para tomar o espaço dos subordinados, fará também com que o pessoal, espertamente, dê início ao processo da “delegação invertida”. Ou seja, ao invés de receber da liderança as tarefas, dará para o chefe tudo aquilo que não gostariam de desenvolver. E o chefe, como bom e abnegado salvador da pátria, assumirá aquilo que deveria ser executado pelos que trabalham com ele.