O Tipo Nove é o ser humano básico, essencial, poderíamos dizer. É simples, contenta-se com pouco e está sempre em busca de pacificar as pessoas à volta. Bonachão ele não gosta de correrias e nem de pressão. O pecado de raiz que o aprisiona é a preguiça. Refletimos sobre algumas atitudes e comportamentos comuns nessa gente.
Os tempos Pós-modernos privilegiam a rapidez. A toda hora chegam mensagens a nos dizer que é preciso correr, para que não se perca o bonde da história. Na TV a vida vai se fazendo presente naquele mesmo momento em que os fatos acontecem. É preciso prontidão para que tudo seja “online”. Vive-se no mundo da instantaneidade. A comida deixa de ser degustada. O tempo urge e por isto melhor que seja engolida nos “fast foods”. A Pós-Modernidade é tempo ultraveloz, mas o Tipo Nove não está se preocupando. Ele continua a seguir o ritmo da vida natural e esta avança em compasso mais lento.
Na vida profissional experimenta-se a mesma dinâmica. Há que se estar alerta para entregar rápido aquilo que esteja sendo demandado. Seja sentimento, produto, ou serviço. Tudo ao mesmo tempo e agora parece ser o recado que vai sendo, subliminarmente, repetido aos quatro ventos pelo mundo. Não por acaso, quanto maior seja a velocidade máxima possível de ser atingida pelo carro, maior será a chance de que se torne objeto de desejo na sociedade. Isto ocorre e o Tipo Nove continua na sua resistência pacífica. Agirá rápido para sobreviver, mas reduzida a pressão logo retornará ao seu ritmo antigo.
Dentro da vida espiritual constata-se o mesmo fenômeno. Nos templos ainda se celebram os ritos finais das liturgias e já é notável o burburinho da gente se preparando para a rápida partida. É como se fosse um sinal de trânsito ao final do cumprimento do tempo vermelho. Bastará um milionésimo de segundo da mudança de cor, para que se ouçam toques das buzinas de quem vem atrás. O Tipo Nove, aquele que segue na primeira fila, é o alvo preferencial das buzinadas de quem vem atrás, mas pensam que se preocupa? Está se lixando.
A tendência do mundo segue na direção da maior rapidez e velocidade. Só que o Nove vai dando seus passos lentos, em direção oposta a essa tendência avassaladora. Ao contrário do que se poderia pensar ele, definitivamente, não está nem um pouco preocupado em estar viajando na contramão desse movimento.
De repente, visto mais à distância, ele pode até passar a impressão de que segue a corrente da correria, mas seu movimento de seguir o rápido fluxo é ilusório. É que ele é mestre nos disfarces e camuflagens. Chegando mais de perto se poderá ver que pisa forte nos freios, ou mesmo que dirige em marcha ré, para não dar na pinta de que avança na direção contrária do fluxo alucinado das gentes e das coisas.
Não é necessário se ficar reparando por muito tempo esse mundo da Pós-modernidade, para constatar que ele não é nem um pouco apropriado ao Tipo Nove. Estacionado à beira do fluxo, sendo empurrado pela torrente, ou navegando em sentido contrário, ele vai refletindo a se perguntar: “Para que tanta pressa? Por que essa velocidade toda? Será que é necessário isto tudo?” A partir dessas três questões o Nove exercerá algo que sabe muito bem realizar: resistirá brava e passivamente.
Nessa reação será possível observar neles dois tipos de comportamento. Uns darão seu jeito de seguirem a maré. Esses fazem isto dando, externamente, mostras de aceitação e até de comprometimento. Agem assim por instinto de sobrevivência, ou para não chamarem a atenção sobre si (detestam serem o alvo dos olhares). Externamente seguem o fluxo, mas por dentro mantém aquele ritmo pausado que tanto apreciam e ao qual estão bem acostumados.
Tem outros que até poderão ser confundidos com Tipos mais ativos do Eneagrama, como os Três, Sete e Oito. Sairão a campo ágeis e determinados como empreendedores, parecendo se sentir bem animados e cheios de motivos, mas ao se perguntar por que agem assim, terão dificuldades em se explicar.
Trata-se de movimento automático e por isto não se dão muito conta dele. Fazem isto para se defender do mundo exigente à volta. Nesse automatismo é comum reparar que, quando estacionado ele tenderá a permanecer, o máximo possível, quieto. Já quando posto em movimento o difícil será arrumar jeito de pará-lo.
Através dessas duas atitudes de resistência do Tipo Nove, que acontecem externamente e pouco os afetam no interior, poderemos ver que eles não costumam agir. Apenas estão reagindo ao ambiente aquietando-se ou se pondo em movimento. A impressão de que sejam ativos e que atuam assim, porque sentem gosto pela agitação e querem ver acontecer os resultados de maneira rápida e efetiva é falsa. Este é o jeito que encontraram para atuar no tempo e no espaço, sem gerar conflitos e menos ainda, chamar sobre eles a atenção.
O pecado de raiz do Tipo Nove é a preguiça. Esta não deve ser reparada somente como indolência e dificuldade com a ação. Precisa ser vista bem além desse prisma. A palavra existente anteriormente e que caracteriza a preguiça vem do latim (através do grego) e se chama acídia. Esta é muito mais um entorpecimento interior, um descuidar-se com o seu eu mais íntimo. Um automatismo que gera a dificuldade de sentir, em profundidade, as suas ligações consigo mesmo, o outro, o mundo e Deus.
A preguiça fundamental do Nove está contida no interior do seu espírito. Faz parte dela a dificuldade de entrar em comunhão com suas várias dimensões. Comungar profundamente com a vida é complicado e requer esforço. Gera cansaço só de notar que a transformação demandará trabalho duro. Vem-lhe o sentimento de incapacidade e opta pelo caminho mais simples e automático da fuga.
Este escape se dá pelo processo da narcotização. Esta pode acontecer de variadas formas. Não só as drogas, o Tipo Nove sabe muito bem disto, narcotizam. Além delas, as aceitas e proibidas, ele também pode estar se narcotizando em frente a uma televisão, através da comida, fazendo uso excessivo do computador e internet, da leitura, da palavra cruzada e até mesmo do movimento.
Não que o Tipo Nove tenha baixa energia. Não é por acaso que ele se encontra posicionado no alto do desenho do Eneagrama. Exatamente no centro do Centro da Vida, da ação. Ao absorver e ao mesmo tempo liberar a energia não somente do seu Centro mas de toda a mandala, ele termina por anulá-la, passando-nos a impressão de que está “desenergizado”. Mais correto seria falar da sua inconsciência da presença enérgica em seu interior.
A acídia espiritual faz com que renegue o desenvolvimento. Melhor deixar como está para se ver como é que fica. Crescer para o Tipo Nove é tomar contato com seu eu mais profundo e nele encontrar-se com seu Criador. A questão é que teme que nessa busca possa se deparar com dois problemas que lhe consumirão energia: trabalho intenso e atento e a possibilidade de conflito.
Um Tipo Nove após vivenciar tremendo conflito na tomada de consciência do seu pecado, a preguiça, por ser em suas palavras “tremendamente trabalhador”, relatou quando se assumiu realmente indolente numa oficina do Eneagrama, que “trabalhava muito para ninguém notar que na verdade era alguém muito preguiçoso”.
As pessoas desse tipo optam por permanecerem em meio ao grupo sem tomar espaço de destaque. Quando ainda imaturos apresentarão tendência de não assumirem posições de liderança. Estas geram a obrigatoriedade de decisões, conduzir mudanças e a tomada de atitudes firmes e assertivas. Só que agindo assim terminarão tendo que se confrontar com as outras pessoas e o Nove foge do conflito, tal qual o diabo escapa da cruz. “Liderar é expor-se aos outros, é ter que se confrontar com eles e isto sempre acaba em confusão”. Um deles me disse num seminário.
Não entrar em conflitos lhe dará como crédito a economia (várias vezes inconsciente) da força interior que possui, amontoando-a e abafando-a ainda mais em seu interior. “O Nove é como o boi. Caso ele soubesse a força que tem e se mobilizasse junto aos seus irmãos, provocariam uma grande revolução. Só que como eles, não temos consciência desse poder.” Outro Tipo Nove partilhava numa reunião.
Energia não gasta e que não encontra espaço para se expandir, irá necessariamente se acumular em seu corpo. Fará isto até que um dia, tal qual panela de pressão com a válvula entupida, explodirá. Sem dúvidas que esta será uma explosão atômica. Quem convive com o Tipo Nove sabe muito bem o que significa o poder dessa bomba interior. Esta explosão poderá se dar de duas maneiras: externamente fazendo grande estardalhaço e causando danos no ambiente, ou de maneira silenciosa e não menos ruinosa, internamente.
A preguiça do Nove ainda inconsciente, acaba por levá-lo a fundir-se com quem e o que esteja ao seu redor. Por isto combina com todos e bem poderá vir a concordar com posturas e opiniões antagônicas. Assim evitam os conflitos e ganham crédito, permanecendo bem com a comunidade, família, grupo social, ou organização.
Mas cuidado porque estar participando de algo, ou ter dado um sim a alguma pergunta, não significará automaticamente a sua concordância. Pode bem ter sido que seu sim foi a maneira que achou para não entrar em discussões. Atenção, porque seu sim pode ser não e vice-versa. Essas negativas em forma de concordância nada mais são do que dimensões da sua resistência ao mundo. Parecendo estar de acordo o Tipo Nove é o cabeça dura do Eneagrama.
O processo de se moldar faz com que se pareçam com todos, sendo-lhes agradáveis. Geralmente aquelas pessoas que você diz o nome delas e todos, imediatamente, concordam que seja alguém “legal e da paz e que é bom se estar por perto dela”, são do Tipo Nove. Misturado ao ambiente no qual foi instalado, será prestativo e bonzinho. Evitará ao máximo chamar a atenção sobre si e desse jeito conseguirá melhor sobreviver.
O Tipo Nove é o ser humano primordial. É o exemplo da humanidade em seu estágio básico. Encontram-se nas raízes humanas e por isto, atavicamente, os outros Tipos carregam o desejo de um retorno à simplicidade básica que ele representa. Não é tão simples se reparar isto. Esta descoberta se tornará mais clara, na medida em que se empreenda uma caminhada rumo ao crescimento espiritual. Nessa hora, ao se deixar de valorizar tanto o ter, para que se siga na dimensão do ser, será mais fácil que se dê conta desse anseio atávico de parecer-se com o Nove.
Ao experimentar longo tempo de desolação o Tipo Nove poderá optar pela fuga do crescimento espiritual se narcotizando e caindo no autoabandono. Nessas horas não será difícil vê-lo perdido em detalhes, olhar posto em lugar nenhum e um sorriso no rosto quase sempre.
A dificuldade que já possuía de discernir entre o que seja essencial daquilo que pode ser deixado em segundo plano, por se configurar em acessório, é perdida totalmente. Passa então a, mais do que adiar tarefas e atividades, a adiar-se, descuidando totalmente da atenção em todos os níveis (consigo mesmo, outro, mundo e Deus).
Consolado o Tipo Nove mais que entrar em contato com Deus, pode alcançar aquilo que os místicos mais desejam: perder-se totalmente na imensidão maravilhosa do colo de Amor de Deus. A sua capacidade de se fundir ao outro que, quando em desolação é mero transtorno, passa, quando integrado, a ser algo a ser buscado no crescimento espiritual: a comunhão plena com a Trindade Santa.
Na história de muitas pessoas pode ter acontecido de que seus pais, professores e demais figuras de autoridade, demonstrassem um certo receio pela falta de movimento. Como se a reflexão e o pensamento fossem perigosos e devessem ser proibidos. É que tendiam a confundir a quietude com o pecado da preguiça. Quem sabe não se tenha recebido, em algum momento da vida, o seguinte mandato, ou algum de cunho semelhante: “menino(a), não fique aí parado. Vá fazer alguma coisa...” A criança cresce e aí se passa a reclamar que ela não consegue ficar quieta e nem ter vida interior.
Quando em estágios de inconsciência o Tipo Nove carrega a imagem falsa de um deus indolente e preguiçoso que vive dormindo e não tem cuidado pelos seus filhos. Quando consciente de si e no caminho do crescimento espiritual, ele passa a ver o verdadeiro rosto do Senhor. Deus é paz, justiça e misericórdia. Aí as palavras de João fazem-se realidade mais que em sua boca, em todo o seu ser: Deus é Amor.
Todos os Tipos, de uma ou outra maneira, estão ligados à acídia do Nove. Cabe mirar-se interiormente para verificar as maneiras pelas quais a preguiça esteja se manifestando, ou se esconda, vida afora. Nessa hora é bom se olhar desde a infância. É possível que desde lá encontremos, mais evidentes, os motivos para a forma de se agir assumida e praticada na vida diária e que nos dificulta no caminhar rumo ao conhecimento de si, do outro e de Deus. A sombra da preguiça, de alguma forma, tem me convidado para que faça abrigo sob ela.
Busque ler e reler o texto para realmente se apropriar do sentido mais profundo do que nele está contido. Para ajudar na sua reflexão há algumas perguntas postas em seguida. Use-as tanto quanto possam ajudá-lo na caminhada e deixe-as de lado caso sinta não serem pertinentes para o conhecimento de si e seu crescimento pessoal e espiritual.
Perguntas para ajudar na reflexão da Preguiça no meu Tipo:
- Tenho consciência da minha preguiça?
- Como ela se oculta, ou se manifesta?
- O Deus da Paz, tão característico do Tipo Nove se manifesta em minha vida?
- Em relação à preguiça tenho consciência de algum mandato da minha infância do qual preciso me libertar?
- Que presente do Tipo Nove mais necessito para a vida espiritual?
Ao final faço o NER.
Resumo:
Pecado de raiz: Preguiça (acídia)
Armadilha: Comodismo
Mecanismo de defesa: Narcotização
Autoimagem: Estou satisfeito
Convite: Ação
Fruto do Espírito: Amor