O Tipo Três do Eneagrama é o Realizador. Aquele que está sempre em movimento a fazer coisas. O pecado de raiz que o aprisiona é a mentira (o autoengano). No texto fazemos algumas considerações sobre o modo como esse Tipo se comporta no dia a dia.
Sempre que me deparo com as grandes construções da humanidade, tais como as pirâmides, o Taj Mahal, a muralha da China, me vem a certeza de que por trás delas existia algum (ou vários) Tipo Três trabalhando. É que eles estão sempre nas imediações das grandes realizações.
Sem eles sentiríamos a ausência dos empreendimentos maiores e que oferecem empregos a tanta gente. Não seriam tão eficazes também as equipes no trabalho, nos esportes e nas comunidades. Far-nos-iam falta vários dos grandes esportistas, como também tantas lideranças das nossas instituições, de que ordem sejam. Sem o Tipo Três a Terra estaria menor, um tanto mais empobrecida, com toda certeza.
O Três está sempre em ação a projetar ou a construir algo. O grande problema é que costuma se identificar com a sua obra. Assim, acaba muitas vezes, quando não se encontra atento, a se misturar com o papel desempenhado. O ser humano e aquilo que se constrói tornam-se uma coisa só.
Ele tem dificuldades em se interiorizar e o fazer coisas, esse estar sempre se movimentando o ajudará a “ficar de fora” de si mesmo. É que ele quando não está ainda bem integrado, apresenta enorme medo do que possa existir na sua intimidade. Por isto lhe é muito confortável correr de um lado ao outro, executando, cobrando, participando de um tanto de eventos.
Este ficar mais nas exterioridades faz com se conheça pouco e gera nele a dificuldade em responder quem ele é realmente. Viver “para fora” fará também com que tenha que desempenhar vários papeis, eis que cada cenário ou ambiente da vida estará a lhe solicitar a atuação em um bem específico e diferente mesmo do que tenha exercido em outro lugar.
O Tipo Três, quanto mais atua, mais ele se depara com o volume crescente de papeis aos quais é chamado a realizar, vida afora. Esses personagens, ao invés de ajudá-lo, o iludem e terminam por afastá-lo ainda mais da sua essência. Acontecerá então que, ao ser perguntado quem ele é realmente, poderá tomar um susto e acabar respondendo com evasivas. Dirá da sua profissão, ou quem sabe daquilo que vem fazendo, o que adora, por exemplo. Fato é que o Três no estágio ainda inconsciente, vive esquecido de que é infinitamente maior do que aquilo que realiza.
Esse desempenhar te tantos personagens, faz com que o Três seja o maior número de máscaras do Eneagrama. Ao longo da existência ele as foi colecionando e, quando já na idade adulta, acabou se deparando com a realidade de ser dono de uma “máscara” para cada um dos tantos papeis que deve praticar pelos cenários da vida. E o interessante é que não costuma fugir deles. Sente-se capacitado a exercê-los e, mais ainda, termina por se sair bem em todos.
“Olha, quando você encontrar pessoa bem chamativa e luminosa, como se fora uma estrada feérica, plena de luz, correndo em direção ao sucesso, pode ter certeza que estará bem próximo a alguém do Tipo Três”. Era o que me dizia um deles. Aliás, sucesso é a palavra que o fisga constantemente. Está sempre à procura dele. Pelo sucesso, quando ainda inconsciente de suas paixões e armadilhas, é capaz de cometer, literalmente, loucuras.
Vale aqui refletir um pouco sobre o que significa o sucesso para o Três. “Sucesso é ter acesso ao pódio e lá em cima, você poderá observar bem, não haverá lugar para mais de um ocupante. Sucesso é o topo, o cume.” Foi desse jeito que uma Três me definiu o sentido dessa palavra, que tanto lhes é significante.
A evidência é uma outra forma dele demonstrar o significado do sucesso. É que o Três abomina o anonimato, a penumbra é difícil para ele. Foge dos estilos mais discretos. Só com crescimento, ou se violentando ele terá um perfil assim.
Como um cão a farejar a caça ele está sempre em busca de reconhecimento. Realizar coisas é uma forma de cobrar dos que lhe são próximos, ou mesmo da sociedade, essa necessidade. Na verdade, ele irá mensurar o tamanho de seu sucesso a partir da resposta que os outros lhe ofertarem a respeito da sua obra feita. Não ter olhar sobre si é dificultoso demais para o Três.
Só que buscar o alto do pódio e estar constantemente em busca do reconhecimento, tem um alto preço. O problema é que o Tipo Três ainda não desenvolvido ou inconsciente costuma pagá-lo. O custo está intimamente ligado ao seu excesso de ação, ao seu nunca conseguir permanecer quieto. Está sempre em movimento. Sentir-se parado para ele é a morte e não será raro que fique viciado em trabalho.
Atenção, porque não significará necessariamente que este movimento constante do Três gerará grandes resultados. É possível que tais agitos, quando ainda não vive numa dimensão integrada, estejam se dando desordenadamente. Aí serão criadores de marola e consequente espuma e não de algo mais real e consistente.
Visto de mais longe o que realizam até poderá ter a aparência de grande obra. Mas ao se chegar mais perto e se reparar melhor, poderá se ver que ela nada mais é do que parte da sua ilusão, do seu engano. Exatamente por ser assim deste jeito é que se tornou conhecido pelo nome de “O realizador”.
O realizador rotineiramente está pensando, planejando e avaliando novos projetos. O pior é que faz isto enquanto já executa os seus. Richard Rhor, um frade franciscano grande conhecedor do Eneagrama, gosta de dizer que o Tipo Três, ao assar seu churrasco, acaba errando a mão e coloca, de maneira desastrada, uns vinte espetos no fogo. A questão é que ele só tem condições de gerenciar uns sete de cada vez. Ocorrerá então que será servida carne esturricada para uns, enquanto outros comerão churrasco praticamente cru.
Agora, caso alguém lhe venha a indagar como foi aquele churrasco oferecido aos amigos, responderá que foi ótimo. “Um sucesso, como sempre”. O Três é possuidor desse dom incrível de transformar fracassos em vitórias. Acaso o pressionemos e o questionemos sobre os evidentes problemas com os espetos crus e queimados, dirá que há gente que gosta desse jeito e assim estava somente atendendo aos reclamos do seu público.
Quando não encontra maneira de escapar da constatação da falha, ele enfim poderá declarar que houve problemas sim, mas que visto sob outra ótica, poderá se ver que o churrasco foi um belo dum aprendizado e que “daí por diante eles serão melhores ainda”.
O Tipo Três é detentor de uma capacidade toda especial para formar e acompanhar equipes. Seu olhar está sempre atento para descobrir talentos, a manter forte o ânimo e a fazer com que a complementaridade possa gerar melhores resultados.
Saber lidar com os grupos, transformando-os em times focados em crescimento e resultados, somado ao seu papel de realizador, faz com que eles sejam bastante valorizados no mercado de trabalho. Poderíamos dizer que costumam ser os “queridinhos” das nossas organizações.
Nelas poderão ser encontrados, em número significativo, no exercício dos papeis de liderança. Como são os campeões do jogo de cintura, eles executam vários personagens, saberão se adequar rapidamente cada vez que mude a cultura ou a política organizacional. Importa manter o pódio, importa permanecer bem aos olhos de quem os esteja liderando.
Há na história do Brasil um fato, relativo à lamentável guerra do Paraguai, que parece ter sido protagonizado por um, ou vários integrantes do Tipo Três. Trata-se da “Retirada da Laguna”. Somente alguém dessa máscara do Eneagrama teria esta capacidade fantástica de transformar uma derrota (ninguém pode se considerar vencedor de uma batalha fugindo) em um sucesso guerreiro.
Externamente o Tipo Três costuma se apresentar bem cuidado e arrumado. Sem dúvida que tratam-se do homem e da mulher da moda. Não que a lancem. Os seus vizinhos do Tipo Quatro é que possuem criatividade para tal. A antena que eles têm é para captar no ambiente para aonde sopra o vento dos estilos e aí se adequem. Farão isto, principalmente, a partir da observação e do seguimento das pessoas mais famosas do seu Tipo.
Esse seguir as modas, aliado ao gosto pelo brilho do reconhecimento e a vontade do pódio, gerarão Tipos Três excessivamente vestidos. Para os demais números do Eneagrama eles estarão um ou dois pontos além do razoável. Para eles estará tudo bem assim do jeito em que se trajam. Tal modo de proceder faz com que as mulheres Três sejam conhecidas como “peruas” e os homens como os “dandi”, os “almofadinhas” do Eneagrama.
O Três é o Tipo da juventude. Uma caracteristica interessante a se observar em muitos deles, é que costumam se parecer um tanto mais jovens do que na realidade o são. Alguns, apesar da idade, sem haver crescido, vão passar pela vida como eternos adolescentes. Terminam por se tornar aqueles adultos imaturos que, não só se vestem, mas se comportam mesmo quando já mais idosos, como os jovens que um dia foram.
Eles estão sempre a competir em alguma coisa. Gostam de olhar em volta buscando algo para se comparar e logo querer ser, estar, ou desempenhar melhor ainda aquilo que observaram. Um dia uma amiga Três veio até mim, para dizer que conseguia se ver em praticamente todos os aspectos do Tipo, “exceto nesta coisa da competição”.
Passado algum tempo ela me contou que enfim havia lhe “caído a ficha”. Negativo que não disputasse. Constatara que só não competia naqueles pontos nos quais possuía certeza de que não teria competência para vencer. Então, sem chances de obter sucesso, “melhor não entrar na briga”, completou sorrindo.
A paixão do Tipo Três é a mentira. Mas cuidado, eis que não se trata exatamente desta mentirinha boba de se dizer, por exemplo, ter ido a um local e haver estado em outro. É uma mentira bem mais profunda e por isto também mais maléfica. Trata-se da manipulação da verdade, moldando-a de jeito a que lhe fique conveniente.
Mais ainda, esta mentira será sentida pelo Três como seu grande engodo existencial. Trata-se aqui do auto-engano. Mais que engambelar os outros, ele se engana a si mesmo. Está costumeiramente se vendendo por um “preço” bem maior do que aquele que realmente vale.
Alías, o Três está sempre se oferecendo. Em qualquer conversa, em toda situação ele haverá de arrumar um jeito de fazer sua propaganda pessoal. Estará, marqueteiro, alardeando seus resultados passados, ou investindo para que conheçam aqueles projetos nos quais está agora empenhado.
Quando centrado o Três tomará consciência das suas reais competências (que são inúmeras). Então ele conhecerá que vale ainda bastante mais do que considerava anteriormente. Não porque se enganava nas suas capacidades, mas porque passará a se ver como uma das lindas faces de Deus.
A imagem anterior que ele guardava do Senhor, um deus duro e só focado em resultados, constantemente em ação a fazer coisas, vai se transfigurando no Deus de Jesus. O Deus do amor e que constrói, pelas suas mãos de Três e das pessoas dos demais tipos o mundo no qual vivemos. Descobrirá a face de Deus que tem como seu sucesso a plena realização dos seus filhos, os seres humanos.
A busca frenética do sucesso e reconhecimento, mantendo-se preso às exterioridades, perderá então todo sentido. Terá sucesso na medida em que as pessoas com as quais convive o tenham. Será reconhecido quando a sua obra deixar de ser “sua” e passar a ser “nossa”. O Três mergulhará em suas águas mais profundas e nelas saberá reconhecer aqueles sentimentos que, até então, lhe eram totalmente desconhecidos.
O Três quando integrado, não mais sentirá necessidade de ter tanto “espeto no fogo”. Buscará menos coisas, mas que sejam mais consistentes, bem mais profundas. Estará então se desenvolvento na direção de uma vida espiritual mais ampla. Nesse caminho é que encontrará verdadeiro sentido e significado nas realizações.
Deixará de se enganar enfim. A mentira então deixará de ser sua muleta. Aquele ponto de apoio na criação e manutenção das relações, consigo mesmo, com os outros e com Deus será enfim abandonada. No trajeto da sua trilha espiritual ele enfim terá conhecido a verdade e será ela, a verdade, como bem disse Jesus, que o libertará.
A partir de tudo que representa o Tipo Três, busquemos refletir sobre a paixão da mentira. Esse autoengano que ilude. Unidos pelo círculo possuímos tudo de todos. Observar-se mais no intuito de verificar, com abertura de coração, como ela se manifesta no tipo do qual faço parte. A sombra da mentira, de alguma forma, tem me convidado para que faça abrigo sob ela.
Busque ler e reler o texto para realmente se apropriar do sentido mais profundo do que nele está contido. Para ajudar na sua reflexão há algumas perguntas postas em seguida. Use-as tanto quanto possam ajudá-lo na caminhada e deixe-as de lado caso sinta não serem pertinentes para o conhecimento de si e seu crescimento pessoal e espiritual.
- Qual é a minha mentira?
- Como me sinto quando minto?
- Como me relaciono com a verdade?
- Vivo para o trabalho, ou o trabalho é parte da minha busca de realização?
- Que significado para mim tem a expressão “sou um sucesso”?
- Deus para mim é realização no Amor?
Anoto minhas observações no caderno do Eneagrama.
Faço o NER.
Resumo:
Pecado de raiz: Mentira (autoengano)
Armadilha: Vaidade
Mecanismo de defesa: Identificação
Autoimagem: Tenho Êxito
Convite: Esperança
Fruto do Espírito: Verdade