O Tipo Um do Eneagrama tem como paixão fundamental a raiva. Neste artigo faremos observaremos alguns comportamentos comuns às pessoas desse Tipo no Eneagrama.
Todo ser humano sente raiva, isto é mais do que normal. O que pode ser considerado como anormal é o domínio dela sobre quem a esteja sentindo. O pecado não é ter raiva, mas se tornar refém dela agindo conforme suas (da ira) diretrizes. Por isto, há um engano em achar que só os Tipos Ativos (Oito, Nove e Um) e dentre esses principalmente o Tipo Um, que tem na raiva sua paixão ou compulsão de raiz, é que devem tomar cuidados para não se tornarem prisioneiros dela.
Esta energia fortíssima, a ira, quando deixada livre, torna-se capaz, independendo do tipo do qual se faça parte, afetar-nos profundamente e quando isto acontece poderá provocar paralisia, insatisfação, irritação, agressividade, reações impulsivas e destrutivas, baixa autoestima e tantos outros comportamentos e atitudes negativos.
Mas por outro lado, quando domada se consegue canalizá-la, domesticá-la mesmo. Aí ela se transformará em força poderosa a nos impelir para adiante. A levar rumo ao crescimento. É que bem cuidada ela se deixa conduzir e dessa maneira, mesmo sob seu signo, seremos nós os autores das ações.
O convite do Eneagrama é para que sublimemos a raiva, dirigindo-a, sem negá-la, para a construção de algo significativo. Deixar-se levar por ela tem o significado de se tornar presa dela e mesmo ficar alimentando destrutivos desejos de vingança.
Essa sublimação - que nunca deverá ser vista como esquecimento - será geradora da ação consciente da ira, e então ela acontecerá envolvida nos sentimentos de compaixão, liderança, assertividade, capacidade de se indignar e fazer-se ser ouvido e compreendido. Em paralelo trará ganho no conhecimento de si mesmo e do outro. É oferta agora de tantos outros comportamentos e atitudes positivos, capazes de construir vida ao redor.
Diante da raiva a vida nos oferece duas opções. Ela poderá ser engolida, ou expelida. Essas possibilidades irão ocorrer também de dois modos. Poderemos nos colocar como reféns, ou seja, mergulhando de cabeça na compulsão e desse jeito perder o controle, como demonstrado acima. Dessa maneira ela será engolida ou expelida de forma selvagem. Quando integrados ou redimidos, poderemos conservar as rédeas da situação, liberando-a naquela medida em que sentirmos seja necessária e construtiva.
Manter dentro de si a ira é guardar veneno no corpo. Expulsá-la violentamente também fará mal, eis que machucará os outros, fazendo em médio prazo com que nos evitem, ou nos agridam, machucando-nos também. No caso de pessoas impossibilitadas do afastamento, até permanecerão próximas, mas agindo como fantasmas. Verdadeiras presenças ausentes. Estarão perto de corpo, mas seus espíritos vagarão por outras estradas.
Alimentar compulsivamente a ira poderá quebrar finos vasos, obrigando-nos à difícil tarefa de ter que juntar os cacos mais adiante e vaso colado nunca fica novo. Sustentar nas mãos o volante significa não reagir simplesmente, mas antes tomar consciência da raiva, buscando exercer a compaixão e a empatia.
Ao se colocar no lugar do outro acrescentaremos novo ponto de vista à situação. Sabemos que aquilo que ele consegue observar na realidade é bem diferente do que temos a possibilidade de ver. Ele enxerga coisas que são para nós ocultas e vice-versa.
Exercer a empatia é potente auxiliar para que controlemos a ação e nos superemos. A partir do olhar diferenciado, poderemos ver um pouco mais além daquilo que está “saltando à vista”. O mais importante aí é a tomada de consciência do que move o outro: os seus reais motivos.
O Tipo Um quando não redimido, tenta exercer controle sobre a raiva escondendo-a. Só que tal método é inócuo, eis que sua raiva terminará por aparecer travestida de irritação. Esta só aumentará na medida em que alguma pessoa, principalmente das mais próximas e queridas dele, denunciar que a “ponta do rabinho” da sua ira, que ele tanto quis ocultar, se encontra aparente.
Para contatar o Um é fundamental que nos sintonizemos com ele. Para isto é bom saber que a sua atenção está sempre buscando comparar, estabelecer diferenças e reparar o que está errado no ambiente, ou no interlocutor. Sintonizar-se com o Um é não estabelecer um contato somente racional e muito menos entrar em devaneios românticos típicos dos emocionais. É lembrar-se que ele é do Centro Ativo.
Ele aprecia o papo direto e franco. Quando a conversa se dá assim dessa forma o Um se coloca mais relaxado e escuta mais. Colocar-se em sintonia com o Um é também escutá-lo com o corpo todo. Virar-se e mirá-lo firme, demonstrando que não se busca mais nada além dele, auxiliará bastante.
São pessoas que têm uma autocrítica mais que exacerbada. Isto quer dizer que muito antes de serem criticados eles já estarão se punindo, irritados, pelo erro cometido. Dizia um Tipo Um que é como se houvesse dentro dele uma luzinha vermelha, acoplada a uma vozinha irritante. Toda vez que um engano é cometido a luzinha começa a piscar insistente e a vozinha a dizer repetidamente: “foi mal, cara!”
O amigo muito ajudará o Tipo Um não colocando ênfase na crítica. Ajude-o a se aceitar como imperfeito sem ficar lhe apontando os defeitos que ele tanto conhece. Mostre que ele é alguém a caminho da perfeição, mas esta é meta que somente poderá ser atingida na eternidade. Uma boa maneira de fazer isto será brincando com ele. Trata-se de gente que possui dificuldade de brincar, de relaxar e curtir as coisas simples. Aquele dia em que o Um conseguir rir de si mesmo será de altas comemorações, porque significa que ele estará mais centrado e consciente de si mesmo e dos outros, crescendo espiritualmente, enfim.
Nesse apoio ao Um ajudará também incentivá-lo e, se for o caso, se oferecer como companhia, para que saia das obrigações e curta mais a vida. Ele, quando está na compulsão pode ter dificuldades mesmo de tirar férias e quando enfim aceita ter hobbies esses, em pouco tempo, poderão se transformar em serviço, ou mesmo, o que é pior, renda. O Um precisa aprender que hora de brincar, de relaxar e de curtir não é hora de permanecer trabalhando.
Como se veem incompletos, cheio de erros e de defeitos internamente, ficam querendo consertar o mundo. Por isto qualquer defeito, por menor que seja, torna-se motivo de crítica e de irritação. Quando desintegrados não é raro apresentarem manias de limpeza e arrumação. Este comportamento funciona neles como paliativo: como por dentro se enxergam sujos e desarrumados, que do lado de fora, pelo menos, tudo esteja limpo, organizado e cuidado.
No trabalho, na família e na comunidade, quando está fechado em si mesmo, o Tipo Um é visto como chato. Irrita-se facilmente e perambula pela casa, ou pelo escritório, tal qual aquele carro do desenho animado da “Corrida Maluca”: com a nuvem preta sobre a cabeça a ameaçar, com raios e trovões, tempestade.
Já quando integrado será ótimo estar perto dele. Será ser de luz a iluminar os caminhos dos que estão à volta. Pronto a ajudar, ensinar e acompanhar. Uma pessoa apta a aceitar os demais compassiva e empaticamente. Mais do que diferentes as pessoas serão percebidas pelo Um como complementares.
Seus projetos terão excelente qualidade (ele sabe cuidar dela), será perseverante naquilo que vê como necessário e que perseguirá com empenho e responsabilidade. Não se dispersará facilmente. O Tipo Um redimido é atento, metódico e disciplinado. Possui regras claras e metas desafiadoras. Sua ausência nas equipes fará com que a qualidade tenda a cair e o foco se torne mais difícil de ser mantido.
Torna-se assim excelente para receber as novas pessoas no trabalho e na comunidade. Vive cheio de compaixão e dono de alegria interior, o que o torna mais leve. Gera inspiração e dá significado a tudo o que realiza. Transforma-se em excelente integrador, professor e treinador (coach) daqueles que necessitam aprender.
Quando ainda desintegrado o Tipo Um carrega uma imagem de Deus semelhante a do Primeiro Testamento da Bíblia. Um deus vingador, punitivo e cheio de ira. Sentem-no como chato. Um ser preocupado com os mínimos detalhes de tudo. Com o micro e o macro funcionamento do mundo (tal qual velho e frio relojoeiro). Esse falso deus do Tipo Um é implicante, irascível e chato. Mais que perfeito, foi tornado perfeccionista pela sua mente. Um deus que não é nada acolhedor e melhor se fará permanecendo o mais distante possível dele.
Quando integrado o Tipo Um deixa de lado essa imagem falsa e idolátrica de Deus e passa a vê-lo como mestre, como líder de valores, um Deus que cuida e dá atenção. Um Deus que é Pai misericordioso e que se preocupa com seus filhos para que vivam bem (salvem-se de tudo que é ruim). Essa imagem da maestria e da sadia perfeição de Deus se mostrará também nele. Redimido o Tipo Um se torna, independente da profissão que tenha assumido na vida, grande educador, alguém a quem se deseja seguir, pois é prova de integridade e valores autênticos.
A nova imagem do Senhor do Tipo Um agora é a de Deus mesmo. Este não mais será aquele buscador de erros e defeitos, pronto a punir, mas sim a do Deus de Jesus, sempre a juntar, numa só ação, a misericórdia e a justiça no trato com os filhos. As pessoas do Tipo Um passam então a sentir Deus como um companheiro de quem é muito prazeroso estar perto, ser íntimo.
A perfeição que antes mais se assemelhava a uma monótona e chata floresta clonada de eucaliptos, sob a qual nem os passarinhos apreciam ficar, passará a ser sentida por eles como valorização dos diferentes. A perfeição se fará então santidade. Caminho de quem se coloca pronto a servir os companheiros vida afora. A perfeição passa a ser Deus e Ele muito mais do que perfeccionista, certinho e chato, transfigura-se em mil diferentes imagens de Amor.
Atenção, porque a raiva (e aqui mais uma vez o recado vai para todos os tipos) pode nos dar a ilusória impressão de que se está “ganhando a vida”. Gera a sensação de poder e até é provável que esteja sendo utilizada para manipular pessoas e buscar atenção. É possível que também nos produza o falso sentimento de assertividade, quando na verdade a nossa ação está se dando de maneira agressiva, ou passiva. Dessa forma, poderemos achar que estamos convencendo do nosso ponto de vista, quando na verdade só estamos, bruscamente, nos impondo.
O sentimento da raiva é como uma cebola. Compõe-se de várias camadas e aquela que se mostra visível não necessariamente representa o seu real fundamento. Nas outras é possível que haja um tanto de frustração e medo. Investigando ainda mais a fundo, quem sabe, a ira não comporte sentimentos de abandono e fragilidade, ou mesmo a busca aflita por mais atenção e cuidado. Importa ter consciência de que não necessariamente aquele a quem é dirigida a raiva, devesse ser o seu real destinatário.
Todos os Tipos, de uma ou outra maneira, estão ligados à ira do Um. Cabe mirar-se interiormente para verificar as maneiras pelas quais essa raiva esteja se manifestando, ou se esconda, vida afora. Nessa hora é bom se olhar desde a infância. É possível que desde lá encontremos, mais evidentes, os motivos para a forma de se agir assumida e praticada na vida diária e que nos dificulta no caminhar rumo ao conhecimento de si, do outro e de Deus. A sombra da ira, de alguma forma, tem me convidado para que faça abrigo sob ela.
Busque ler e reler o texto para realmente se apropriar do sentido mais profundo do que nele está contido. Para ajudar na sua reflexão há algumas perguntas e duas cenas postas em seguida. Use-as tanto quanto possam ajudá-lo na caminhada e deixe-as de lado caso sinta não serem pertinentes para o conhecimento de si e seu crescimento pessoal e espiritual.
- Tenho raiva de quê?
- Como lido com a raiva na vida diária?
- De que maneiras ela me faz prisioneiro?
As Cenas
A – Como reajo diante disto (maneira inconsciente)?
B – Como ajo diante disto (maneira consciente)?
Cena 1
Veja-se na posição de líder. Você delegou uma determinada tarefa para alguém da sua equipe. Deu-lhe os recursos necessários, disse-lhe da importância do tema, afirmou o prazo que teria para realizá-la e até se colocou disponível caso necessitasse de ajuda. A partir daí houve silêncio. Chega enfim o tempo acordado e nada lhe chega. Você vai à pessoa e descobre que a tarefa não está pronta...
Cena 2
A fila do Banco parece nem andar e você está bem atrasado/a. Há bastante coisa a ser feita e literalmente está preso/a naquela corrente de gente em busca de atendimento. De repente alguém passa por você e caminha até o caixa. Apresenta-lhe um papel que ele apanha e lê deixando-o sobre a bancada. A pessoa permanece ao lado daquele que está sendo atendido e que, com o corpo, demonstra sinais de descontentamento, enquanto o funcionário parece fazer duas coisas. Mantém o atendimento e ao mesmo tempo, dialoga com quem lhe chegou de repente pela lateral da fila....
Ao final anoto os sentimentos aflorados no meu caderno do Eneagrama e faço o NER.
Caso você queira conhecer, através de um conto, mais características do Tipo Um, poderá ler A Abelha Adélia e a Perfeição do Mundo no meu site neste endereço:
http://www.fernandocyrino.com/visualizar.php?idt=2375349
Resumo:
Pecado de raiz: Ira
Armadilha: Melindre
Mecanismo de defesa: Controle de reação
Autoimagem: Tenho razão, sou correto
Convite: Sadia perfeição
Fruto do Espírito: Serenidade